Enquanto políticos em Brasília e Washington batem bumbo, o governo brasileiro prepara uma lei que lhe dá o poder de retaliar quem quiser, como quiser. E quem vai pagar a conta dessa guerra é você.
A engrenagem estatal não para de girar. E quase sempre, ela gira para expandir o seu próprio poder. A notícia da vez é mais um exemplo clássico dessa dinâmica. Diante da imposição de uma nova tarifa de 50% sobre produtos brasileiros por parte do governo daquele país que estatistas chamam de Estados Unidos da América, a reação do governo brasileiro foi imediata. Mas não foi uma defesa da liberdade ou do livre comércio. Foi o anúncio de mais intervenção.
O vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, anunciou que nos próximos dias será editado o decreto que regulamenta a chamada "Lei de Reciprocidade". Sancionada em abril deste ano como a Lei nº 15.122, ela é, na prática, um cheque em branco. Um cheque para que o governo inicie sua própria guerra comercial, com seus próprios critérios e com o seu dinheiro.
A justificativa é nobre, como sempre. Afirmam que é preciso "defender a indústria nacional". Dizem que é uma resposta necessária a "medidas protecionistas injustas". Mas, ao analisar o que essa lei realmente significa e à luz da teoria libertária, vemos a verdadeira face da medida. Trata-se de uma perigosa concentração de poder. Uma ferramenta que pune todos os cidadãos para, supostamente, proteger alguns.
O Cheque em Branco da "Reciprocidade"
(Sugestão de Pausa)
Para entender o perigo, precisamos olhar para a própria lei. A Lei 15.122/2025 cria um conselho de ministros com poder para retaliar países que imponham barreiras a produtos ou serviços brasileiros. As sanções que o governo poderá aplicar são vastas e assustadoras. Elas incluem a suspensão de concessões comerciais, a aplicação de sobretaxas, e até mesmo a suspensão de direitos de propriedade intelectual.
Imagine a cena. Um burocrata em Brasília, que nunca administrou uma empresa de importação ou exportação, decidirá que uma patente de uma empresa estrangeira não vale mais nada em território nacional. Isso não é defesa. Isso é a destruição da segurança jurídica, o pilar fundamental para qualquer investimento e desenvolvimento econômico.
Os critérios para aplicar essas retaliações são propositalmente vagos. A lei fala em "interferência nas escolhas soberanas do país" ou a imposição de "requisitos ambientais ou trabalhistas mais onerosos" do que os previstos em acordos internacionais. O que isso significa na prática? Significa qualquer coisa que o governo de plantão queira que signifique.
Essa discricionariedade é a essência do poder tirânico. Ela substitui a clareza das regras pela arbitrariedade da caneta. Empresários, produtores e consumidores não poderão mais se planejar com base em leis estáveis. Terão que adivinhar o humor dos políticos e os ventos da geopolítica. O cálculo econômico se torna impossível quando as regras do jogo podem ser viradas de cabeça para baixo a qualquer momento por um comitê.
A Arrogância Fatal do Planejador Central
(Sugestão de Pausa)
A Escola Austríaca de Economia, através de pensadores como Friedrich Hayek, nos deu um conceito fundamental: a "arrogância fatal". É a crença perigosa de que planejadores centrais podem coletar e processar a informação necessária para organizar a sociedade e a economia de forma mais eficiente que o mercado. A Lei de Reciprocidade é um monumento a essa arrogância.
O comércio internacional é uma rede de complexidade inimaginável. Envolve bilhões de decisões individuais, tomadas por milhões de pessoas todos os dias. Cada preço, cada contrato, cada rota de navio, é uma peça de informação em um quebra-cabeça gigantesco. O mercado, através do sistema de preços, coordena tudo isso de forma espontânea e descentralizada.
A lei brasileira presume que um "Conselho Estratégico" de ministros pode substituir essa ordem espontânea. Eles acreditam que podem, com uma canetada, "consertar" uma distorção (a tarifa americana) criando outra distorção (a retaliação brasileira). Isso é como tentar apagar um incêndio jogando mais gasolina.
Ludwig von Mises, outro gigante da Escola Austríaca, já explicava que o protecionismo é uma falácia. Uma tarifa não é uma arma contra um país estrangeiro. É uma arma contra os próprios cidadãos. Uma tarifa de importação é, simplesmente, um imposto pago pelo consumidor local. Quando o governo dos EUA taxa o produto brasileiro, ele está punindo o consumidor americano, que pagará mais caro.
Quando o governo brasileiro retalia, taxando um produto americano, ele não está punindo o governo americano. Ele está punindo você. Está punindo o brasileiro que precisa daquele insumo para sua fábrica. Está punindo a família que pagará mais caro pelo produto final no supermercado. A guerra comercial é uma guerra de governos contra seus próprios povos, com os consumidores como as maiores vítimas.
A Escalada da Insensatez: Lições Não Aprendidas
(Sugestão de Pausa)
Não precisamos ir longe para ver os resultados dessa política. A guerra comercial iniciada por Donald Trump contra a China é um estudo de caso perfeito. Milhares de tarifas foram impostas de ambos os lados. E qual foi o resultado? Um estudo do Federal Reserve Bank de Nova York concluiu que as tarifas foram quase que inteiramente repassadas aos preços para consumidores e empresas americanas. Elas não alteraram significativamente o déficit comercial e causaram perdas de competitividade e empregos em vários setores.
A lógica da retaliação é a lógica da briga de rua. Um empurra, o outro devolve com um soco, e logo todos saem perdendo. A Lei de Reciprocidade coloca o Brasil oficialmente nessa espiral de irracionalidade. Ela cria um incentivo para que o governo esteja permanentemente em busca de uma briga, para justificar o uso do seu novo e poderoso brinquedo.
A retórica é sempre a de "proteger empregos". Mas o que o protecionismo realmente faz é proteger produtores ineficientes da concorrência. Ele permite que empresas com boas conexões políticas vendam produtos de pior qualidade e mais caros, pois o consumidor não tem a opção de comprar de fora. Os empregos "salvos" em um setor são destruídos em muitos outros, que dependiam de insumos importados mais baratos ou que perdem mercados de exportação devido à retaliação.
A Solução Real: A Liberdade
(Sugestão de Pausa)
Enquanto os estatistas propõem a força, o mercado encontra soluções pacíficas e voluntárias. Diante de instabilidades geopolíticas e guerras comerciais, o que as empresas privadas fazem? Elas se adaptam. Elas praticam o que se chama de "nearshoring" ou "friend-shoring". Ou seja, buscam diversificar suas cadeias de suprimentos, procurando fornecedores em países mais próximos ou com maior estabilidade política.
Essa é a ordem espontânea em ação. Não precisa de um comitê de ministros. Não precisa de uma lei que ameace rasgar contratos e patentes. Precisa apenas de liberdade e segurança jurídica. As empresas, em busca do lucro (que nada mais é do que o sinal de que estão servindo bem ao consumidor), encontram os caminhos mais eficientes para contornar os problemas criados pelos Estados.
A melhor defesa contra o protecionismo de outro país não é retaliar com mais protecionismo. A melhor defesa é a abertura unilateral. É remover as próprias barreiras, baratear o custo para os próprios consumidores e produtores, e se tornar um porto seguro para o capital e o comércio global. Um país verdadeiramente aberto se torna tão integrado e essencial para a economia mundial que qualquer sanção contra ele se torna um tiro no pé para quem a impõe.
Mas essa solução exige coragem. Exige confiança nos indivíduos e no mercado. Exige que os políticos abram mão do poder. E isso, como sabemos, é algo que eles raramente estão dispostos a fazer. A Lei de Reciprocidade é a prova disso. É mais fácil e politicamente mais rentável posar de "defensor da pátria" e iniciar uma briga, do que fazer o trabalho difícil de liberalizar a economia.
(Sugestão de Pausa)
A regulamentação iminente da Lei de Reciprocidade não é um ato de defesa, mas um ato de agressão. É a expansão do poder estatal sobre a vida e a propriedade de todos. Ela não protegerá a indústria, mas sim os industriais ineficientes. Ela não punirá governos estrangeiros, mas sim os consumidores brasileiros.
Ela substitui a previsibilidade da lei pela arbitrariedade do poder político, minando a confiança e afugentando investimentos. É a receita para o empobrecimento, disfarçada de patriotismo.
A verdadeira reciprocidade, a única que gera prosperidade, é a das trocas voluntárias. É a liberdade de cada indivíduo para comprar, vender e contratar com quem quiser, onde quer que essa pessoa esteja. Qualquer coisa diferente disso é apenas a velha e conhecida violência estatal, agora com um nome mais sofisticado. A conta, como sempre, chegará para nós.
https://www.institutoliberal.org.br/blog/protecionismo-versus-livre-comercio
https://www.infomoney.com.br/colunistas/ifl-instituto-de-formacao-de-lideres/protecionismo-economico-quem-de-fato-ele-protege/
https://revistas.usp.br/ee/article/download/116888/114423/214871
https://www.brazabank.com.br/conteudo/guerra-comercial-eua-china-estagflacao/https://forbes.com.br/colunas/2025/04/guerra-comercial-entre-eua-e-china-reacende-o-risco-de-estagflacao-global/