No conflito de visões de mundo entre o ocidente e o oriente, a liberdade mostra-se diferente para ambas as sociedades.
A série “Shogun: A gloriosa saga do Japão”, é um drama histórico produzido pela FX, escrito por James Clavell. A partir das histórias do navegador inglês William Adams, que chegou ao Japão no início do século XVII como náufrago, sagrando-se samurai posteriormente, Clavell criou este épico asiático. Adams escreveu a história do início do Shogunato Tokugawa, vivenciada por ele na ilha, que vai da guerra civil japonesa, até a ascensão ao poder de Tokugawa Ieyasu.
Antes de continuarmos, precisamos dar o devido aviso de spoiler. Assim, se desejar veja primeiro a série e depois volte aqui para ver nossa famosa e estimada visão libertária sobre o tema. Dado os devidos avisos, vamos ao vídeo.
Para aqueles que não conhecem a história japonesa, Shogun é um título semelhante a um senhor feudal europeu, com a diferença de que além de ser dono de terras, também era o líder militar local. Seria algo como o Júlio César está para Roma, evocando uma concentração de poder que uniria propriedades de terra, laços familiares, reconhecimento social e poder bélico. Portanto, o Shogun, era um líder extremamente importante e influente no Japão.
Mas, antes que qualquer liberteen comece a julgar esse tipo de organização social dizendo ser opressora, adianto que trataremos deste assunto logo mais. Entretanto, para deixá-los avisado, este tema não é nada simples. É importante lembrar que estamos na idade média e, análogo à Europa, no Japão, as províncias gozavam de muita autonomia, governadas por líderes locais que eram, às vezes, administradores, juízes e combatentes ao mesmo tempo. Havia um incrível código de honra e conduta que regia esses shogunatos, que faria corar qualquer governante do estado moderno. Portanto, não existe comparação com a atualidade! Não se pode avaliar o passado com a mente do presente. Esse é um erro crasso que não desejamos cometer aqui. É claro que também não era o ancapistão, mas esse conceito sequer existia naquele tempo.
Outra coisa importante que precisamos lembrar é que, nessa época, os portugueses já mantinham fortes laços de comércio com o Japão, China, Malásia, Taiwan e demais países asiáticos, exercendo uma liderança nunca vista no mundo. As navegações portuguesas conectaram, pela primeira vez e de maneira irreversível, todos os povos da terra! Era o início da dita globalização. Por isso que a série mostra a presença de portugueses, em sua maioria do clero católico, metido em negociatas escusas por poder e influência. Isso carece de fontes históricas. Mas, esse pessoal anglo-saxão moderno não perderia uma oportunidade de pintar os portugueses e espanhóis de bobos e feios e, em contrapartida, colocar os ingleses protestantes como os grandes heróis da história. Sim, a série é muito mais que isso, mas é importante avisar sobre isso.
Se quiser saber mais sobre esse tema, recomendo o livro que é o testemunho de um americano: “Tree of Hate” de Philip Powell. A obra mostra como, ao longo dos últimos séculos, a Inglaterra e suas colônias fizeram de tudo para avançar narrativas a fim de destruir a fama dos portugueses e espanhóis, objetivando elevar a sua, ainda que a mentira e distorção da verdade fossem utilizadas. Levando a narrativa para níveis do absurdo e nos massacrando com todo tipo de mídia e propaganda, essa gente pervertida cria o que ficou conhecido como “lenda negra” ou imperiofobia. Portanto, meu caro, muito cuidado ao assistir séries e filmes, além de ler obras épicas escritas por ingleses que difamam os latinos. Ou você gostaria de ser colonizado por genocidas assumidos que reduziram a população indígena a cerca de 2%? Aqui no Brasil, testes de DNA apontam para mais de um terço da população atual possui ascendência indígena. Ou que proibiam o casamento inter-racial, impedindo a miscigenação e aprofundando o preconceito, criando segregação racial e o apartheid? Na verdade, só conseguiram criar o apartheid no Brasil recentemente com a política de cotas nas universidades e que infelizmente vem se expandido. Não falaremos sobre o fato deles executarem religiosos católicos. Também não diremos o quanto eles exploraram as colônias usando empresas privadas desprovidas de qualquer escrúpulo e protegidas pelas máfias estatais de sua época, que de tão bandidas contabilizavam roubos e pirataria em suas planilhas de lucro. Acreditamos que isso seja o suficiente para acabar com qualquer complexo de vira-lata que a série queira criar nos latinos.
De maneira geral, não é nosso objetivo contar a história da série, mas analisar como o tema da liberdade é abordado entre os personagens. É realmente interessante notar como a matéria da liberdade aparece em vários momentos, de maneiras diferentes. O seriado explora em vários aspectos a diferença de visão de mundo entre europeus anglo-saxões e japoneses, marcando aspectos fundamentais da organização social, das relações interpessoais, da ética e da moral, que divergiam muitas vezes entre esses povos. É interessante notar como cada um via o outro como um alienígena! É o velho conflito entre ocidente e oriente, mas ainda mais complexo, visto de dentro da sociedade japonesa, que se desenvolveu praticamente isolada nas ilhas do arquipélago.
Os diálogos principais sobre liberdade surgem a partir da relação entre o navegador inglês, John, e sua intérprete Mariko, que segundo o relato original de William Adams se davam em português, afinal, ninguém no Japão falava inglês. Agora, especificamente na cena em que John vai tomar banho - momento temido por todo bom anglo-saxão -, ele conta para Mariko como seria a experiência de caminhar na beira do Rio Tâmisa em Londres. Segundo o navegador, dada a esplêndida beleza do lugar seria possível esquecer de tudo e, enfim, se sentir livre, como completa sua interlocutora.
Então, nesse ponto a liberdade aparece como contraponto a opressão provocada pela sociedade. Cada indivíduo, ao viver em sociedade, fica impedido de fazer tudo o que deseja, à sua maneira e tempo. Existem inúmeras condicionantes e limitantes que vão desde a disponibilidade de recursos humanos e materiais, até questões éticas, morais e costumes locais, inclusive, que condicionam o agir do indivíduo. Por vezes essas condições sociais se manifestam de maneira tênue. Por vezes, chegam a agredir a indivíduo e até impedir o desenvolvimento do ser humano, descaracterizando-o na sua essência. Nesse sentido, o contato com a natureza surge como uma possibilidade de fuga desse sistema que nos oprime.
Desde a Grécia antiga se propõe uma retomada do contato com a natureza para possibilitar momentos de interação com o mundo natural e introspecção, mesclando assim atividades manuais que fortalecem o corpo, com raciocínio contemplativo que fortalece a mente. Ambos, aliados a busca pelo que é eterno e imutável que fortalece a alma. Noutra cena, John propõe que Mariko simplesmente abandone seu marido e deixe a vila, buscando uma vida que faça sentido a ela. Aqui entra em cena aquela visão manjada de que liberdade é fazer o que se quer e em qualquer momento, sem pensar nas suas consequências posteriores. Essa é a típica visão iluminista da liberdade. Mariko, contudo, lhe responde que era ele quem não era livre, mas escravo de si e de suas paixões, como a ira! Ela, por outro lado, usava sua liberdade para não se entregar ao marido, tornando-se uma montanha de gelo e não lhe dando absolutamente nada: nem amor, nem ódio! Apenas, indiferença.
É claro que a liberdade para fazer o que se quer, a qualquer momento e independente das suas consequências, não é liberdade! Isso é apenas ignorância e despreparo emocional. Pense: se o importante é manter a liberdade, como podemos defender a liberdade para tomar uma decisão que lhe tira a liberdade? Sequer faz sentido uma coisa anacrônica dessa. Nesse momento, Mariko apresenta uma visão de liberdade muito mais profunda daquela apresentada pelo inglês, que compreende a liberdade para se fazer o que quiser, mesmo que seja se jogar de um precipício.
E, por último, existe a cena em que John, já elevado à condição de hatamoto – um tipo de samurai com acesso direto ao imperador –, que de posse de um faisão, o pendura na entrada da casa para preparar um prato típico inglês. Acontece que ele se esquece do bicho, que começa a apodrecer e incomodar a todos os que trabalham na sua propriedade. O ponto é que ele diz que quem mexer no bicho, morre! Apesar da ironia com que diz, a frase é tomada pelos serviçais como um decreto. Não aguentando mais a degradação do lugar, o jardineiro se dispõe a retirar os restos podres do animal pendurado e ser executado logo em seguida.
Ao saber do ocorrido, o inglês, atônito pelo jardineiro ser executado, diz que isso não faz sentido! Prontamente, ele é contestado por Mariko, quando diz: “suas palavras fizeram dar sentido!”. E complementa exclamando: “o jardineiro morreu feliz por uma boa causa”. Se por um lado apenas palavras inconsequentes causam desgraça, por outro, atitudes heroicas fazem restaurar a sanidade do ambiente. Parece mesmo nos alertar sobre a força de nossas palavras e como devemos usá-las de maneira parcimoniosa e de como a liberdade de entregar a própria vida pode fazer sentido quando por uma causa maior.
Bem, há inúmeras passagens das quais poderíamos tirar bons ensinamentos para nosso desenvolvimento pessoal. Contudo, para o vídeo não ficar muito longo, vamos nos ater apenas a estas. Mas, e você? Observou alguma outra passagem que podemos ver a liberdade como tema principal? Compartilhe conosco nos comentários ou envie um artigo para o Visão Libertária. E para continuar nesse assunto, veja agora o vídeo: “A economia do Japão”, o link está aqui na descrição.
A economia do Japão
https://www.youtube.com/watch?v=xSV7Q79GmuE