Impostinho do Amor: A Nova Taxa dos Criminosos de Condomínio no Rio de Janeiro

Nem todo homem armado defende a liberdade. Às vezes, defende o monopólio. Arme todos e, em vez de escravos, teremos homens debatendo ideias como iguais. Não haverá mais o monopólio da violência.

Eis que, sob o véu da coerção, criminosos, com a audácia de falsos soberanos, impõem tributos aos moradores de um condomínio e de comerciantes na zona norte do Rio de Janeiro. Não por democracia condominial, mas pela força bruta. Chamam isso de "proteção", mas só se for proteção deles mesmos, os traficantes.
Lojas e residências, reféns de taxas mensais, curvam-se ante o medo de represálias. A Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas, ciente do ultraje, move suas enferrujadas e lentas engrenagens investigativas. Contudo, a sombra do tráfico, que reina nos morros do Cajueiro e da Serrinha, permanece incólume.
E o que dizer do posto da Polícia Militar, erguido com pompa na avenida Edgard Romero? Um símbolo, talvez, mas incapaz de eliminar a insegurança do local. Os assaltos, esses, sim, persistem e continuam a aterrorizar a população.
Vejam a ironia: o Estado, que clama por ser o monopólio da força, falha em proteger; e os criminosos cobram por uma paz que não entregam. Não é isso, a própria definição de extorsão? Inspirado em Frederic Bastiat, um liberal francês do século 19, eu diria sobre o cenário de insegurança no Brasil: Quebram-se as janelas da ordem, e os cacos recaem sobre os inocentes, enquanto a liberdade, essa vítima silenciosa, aguenta o peso da opressão.
Essa notícia é tão tosca, que parece até um filme pastelão de máfias. Um síndico convocou assembleia para discutir pagamento de taxa a traficantes em Madureira, na zona norte da capital fluminense. Os moradores falam em uma taxa de 1800 reais. É o imposto ilegal. Se fosse o estado brasileiro seria o impostinho do amor.
Mas sejamos mais sólidos na análise. O estado é um conjunto de ideias selecionadas culturalmente ao longo de séculos, e essas ideias foram passadas para inúmeras gerações que, sem questionar, reproduziram para seus filhos, e assim por diante. Essa seleção memética faz lembrar a seleção genética, no sentido de que assim como os genes menos violentos prosperam, os memes menos violentos também são selecionados. Explico. Na longa cadeia de seleção natural, os homens mais violentos tendem a se matar. A sociedade ainda tem gente violenta, mas é inegável que a brutalidade mais bárbara do passado foi diminuindo com o tempo. O PNA, ou princípio de não-agressão, é um fundamento que está em nossos genes. Se não houvesse um reconhecimento do direito à vida e propriedade do outro - mesmo que de forma intuitiva -, a humanidade teria se extinguido ainda nos tempos primitivos, quando era nômade e caçadora.
De igual modo, os impérios antigos eram mais sanguinolentos. Porém, ao longo do processo histórico o Estado foi ficando menos brutal e mais "hipnótico", digamos assim, no sentido de focar no controle mental de seus súditos. Claro, você poderá me refutar ao dizer que os estados coletivistas modernos como os fascistas e comunistas foram os que mais mataram pessoas em toda a história humana. Você não está errado. Mas essas mortes talvez tenham sido maiores em número devido ao poderio das armas de fogo, tecnologias militares muito avançades, além de ideais belicistas e expansionistas. Imagine Gengis Khan com uma bomba atômica? Ele com certeza faria um enorme estrago na civilização humana. O ponto é: o aparato estatal foi se transformando numa máquina memética que misturou ideias de dar uma contraprestação aos pagadores de impostos ao mesmo tempo em que parasita a sociedade. Como bem explicou o libertário Robert LeFreve: “O estado tem sido muito mais astuto do que muitos supõe. Ele misturou virtude e desvirtude nas suas demandas."
Quem compete com estados? Outros estados e máfias. O leviatã é um mercado vermelho, para quem já está familiarizado com os conceitos do agorismo. Mercados vermelhos são fundamentalmente criminosos, porque agridem dois pilares da justiça: 1) a voluntariedade das relações e 2) a propriedade privada.
Dito isso, o leviatã estatal compete com máfias de crime organizado, que são máquinas de controle mais violentas. E nessa seleção natural o estado institucionalizado geralmente ganha. Por quê? Porque ele foca mais na engenharia social e, assim, consegue o consentimento das pessoas. Do ponto de vista libertário, todo estado é um tipo de ditadura - uns muito piores, outros menos piores. Mas toda ditadura só existe porque uma parcela considerável da população a apoia, nem que seja de forma passiva e resignada. A população não quer apoiar máfias muito violentas como as terríveis facções criminosas que controlam os morros das favelas. O povo precisa de uma contraprestação de serviços que evoluiu historicamente. De aristocracias decadentes vivendo de impostos de plebeus sofredores, o ente estatal se tornou uma máquina que dá emprego a alguns, parasita muitos outros, mas pelo menos fornece algum serviço, mesmo que precário. Estados menos corruptos protegem mais seus cidadãos-súditos. Estados mais inchados criam mais castas privilegiadas e, estados como o Brasil, bem... O Brasil é sui generis. Extremamente corrupto e coligado com narcoterroristas ligados ao Foro de São Paulo de militantes comunistas. Joga um jogo duplo na diplomacia. Muito intervencionista na economia, o que impede o nosso desenvolvimento. Possui uma das maiores cargas tributárias do mundo, regrediu para a censura, não tem segurança nem jurídica, nem paz social. O Brasil é, sem sombra de dúvida, um dos piores estados do mundo livre. Não quer dizer que não existam outros tantos bem piores, mas estamos na lista dos piores.
Sob a lente do anarcocapitalismo, o problema da extorsão e insegurança na avenida Edgard Romero seria enfrentado não por um estado falho, que muitas vezes fortalece indiretamente as gangues em conluio eleitoral com elas. O problema seria enfrentado por agências privadas de segurança operando em um mercado livre. Eis como tal solução poderia se desdobrar, com a clareza que o próprio liberal Gustave de Molinari, se fosse vivo hoje, teria defendido:
Primeiro. Agências Privadas de Segurança Competitivas: Sem o monopólio estatal, moradores e comerciantes contratariam agências de segurança privada baseadas em reputação, eficiência e custo. Essas empresas, movidas pelo lucro e pela necessidade de manter clientes, teriam incentivos para proteger efetivamente seus contratantes contra criminosos de todos os tipos. Diferentemente do leviatã estatal, que cobra impostos coercitivamente sem garantir resultados, essas agências só prosperariam se entregassem segurança real. Podemos expandir as agências seguro-protetivas para Governo Privados, que seriam modelos de governanças voluntárias que respeitam o direito natural à propriedade privada. Uma mesma região poderia ter vários governos, nos quais cada cidadão se filia de acordo com suas inclinações econômicas e morais.
Segundo. Contratos Voluntários e Responsabilização: Cada condomínio, loja ou residência negociaria contratos claros com as agências seguro-protetivas, especificando níveis de proteção (patrulhas, câmeras, resposta armada). Se uma agência falhasse, os clientes poderiam rescindir o contrato e contratar concorrentes, forçando as empresas a melhorar seu serviço continuamente. Isso contrasta com o estado, que, mesmo ineficaz, exige obediência e impostos, e não podemos escolher se queremos pagar ou não, por isso o leviatã apenas piora seus serviços públicos.
Terceiro. Resolução de Conflitos no Mercado: Para evitar que agências privadas se tornem "novas milícias", o anarcocapitalismo propõe tribunais privados e arbitragem. Disputas entre agências ou entre clientes e agências seriam resolvidas por juízes independentes, cuja reputação também dependeria da imparcialidade. Esse sistema, baseado em consentimento mútuo, reduziria o risco de abusos. 
Quarto. Desincentivo às Gangues: Traficantes e milícias prosperam onde há vácuo de poder ou conivência estatal. Agências privadas, armadas e focadas em proteger seus clientes, criariam um ambiente hostil para criminosos. Sem o monopólio estatal da força, que muitas vezes desarma cidadãos e deixa comunidades vulneráveis, os próprios moradores poderiam se organizar ou apoiar as agências. Isso aumentaria a resistência local. Além disso, sem um monopólio sobre produtos no mercado negro, como certos tipos de drogas que são produzidas e vendidas por poderosos cartéis, nenhuma facção criminosa teria grandes incentivos de lucro atuando fora da lei. Não haveria retorno financeiro em ser agressivo com pessoas pacíficas, mas fortemente armadas, como há hoje.

Quinto. Inovação e Prevenção: No mercado livre, agências competiriam para oferecer soluções inovadoras – desde tecnologias de vigilância até estratégias comunitárias de prevenção. Por exemplo, poderiam integrar moradores em redes de alerta ou financiar projetos locais para enfraquecer o apelo do crime organizado, como programas de emprego ou esportes, algo que o Estado raramente faz com eficiência. Teríamos também algumas escolas focadas em preparar as pessoas para se defender corretamente, e manusear certos armamentos.
Quando o Estado proíbe mercados livres de segurança e desarma cidadãos, o que ocorre na prática são condições favoráveis para que gangues despontem. No anarcocapitalismo, a ausência de regulamentações estatais permitiria que comunidades e empresas se defendessem a um custo muito mais baixo, sem os altos impostos que temos hoje. Isso quebraria o ciclo onde o Estado falha e, paradoxalmente, fortalece o crime organizado por sua ineficiência ou corrupção. Aliás, o Estado Democrático de Direito tem um forte incentivo para falhar na segurança, não é mesmo? Assim ele pode se arrogar necessário, e exigir sempre mais impostos para resolver o problema da segurança pública. E sabemos bem que nossos juristas, formados por professores marxistas, amam soltar criminosos de alta periculosidade, pois os veem como se fossem vítimas da sociedade. Tá tudo errado, e isso começa na formação em faculdades aparelhadas por esquerdistas.
Mas entenda, a anarquia de mercado não significa a inexistência de monopólios e organizações dominadoras. Esse é um assunto muito complexo que valeria outros vídeos. Mas o ponto central é que deve existir um império da lei. Nesse contexto, sugiro o livro Manual para entender direito o Libertarianismo, do cientista social e economista alemão Hans Herman Hoppe.
Para arrematar, vamos à objeção comum dos estatistas: "E se as agências se corromperem ou entrarem em conflito?" Resposta: O mercado pune a corrupção com perda de clientes. Conflitos entre agências seriam resolvidos por arbitragem, pois guerras são custosas e ruins para os negócios. Além disso, a descentralização impede que uma única entidade monopolize a violência, como ocorre com o estado moderno. É importante lembrar que num mercado sem impostos e com enorme concorrência, as armas seriam infinitamente mais baratas do que são hoje, e qualquer pessoa adulta conseguiria comprar. Ou seja, se proteger seria mais fácil
Esse pessoal que sabe que o poder não deixa vácuo quer resolver o problema dando superpoderes a um ente. A melhor forma de evitar poderes absolutamente corruptos é descentralizando-o absolutamente. Várias polícias fiscalizam umas às outras. Uma polícia única estatal, contudo, fecha-se em um corporativismo que privilegia os seus integrantes. Você sabe, se um policial comete crime, seus camaradas logo tentam ocultar as provas e ajudar de alguma forma seu parceiro de trabalho, para não queimar a reputação da instituição. Não precisamos nem mencionar aqui o tanto de corrupção que há na polícia estatal.
Dessa forma, em Madureira, na mais famosa cidade do Brasil, que infelizmente não tão é maravilhosa assim, a segurança não seria um privilégio extorquido por criminosos ou prometido em vão pelo Estado, mas um serviço contratado livremente, moldado pela demanda dos moradores e pela competição entre fornecedores. E tem jeito de o estado retroceder? Muito difícil. Mas imagine se vários anarcocapitalistas começassem a se eleger e propor, pelo menos, agências privadas de investigação? Essas agências produziriam provas e relatórios para o Ministério Público, impelindo-o a oferecer denúncias (processos). E se projetos de lei desconcentrassem poder do Ministério Público e criasse outros órgãos de denúncia? É uma ideia gradualista? Sim. É o melhor dos mundos? Não. O que podemos fazer também é juntar grupos de pessoas agoristas para criar sua sociedade oculta, tecnológica e paralela ao Estado. Se puder, venda seu apartamento ou casa em Madureira, volte para o campo e arme-se como puder. O Brasil não está para brincadeiras e a tendência não é de melhoras.


Referências:

BASTIAT, Fréderic. O Estado. In: O que se vê e o que não se vê. Tradução de Ronaldo da Silva Legey. São Paulo: Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2010. P. 139-142.

Artigo “Return to Babylon” de Robert LeFevre, inserto em SED III, New Libertarian Manifesto – 25th anniversary edition. KoPubCo. August, 2006. 117-118 p.

MOLINARI, Gustave de. Da Produção de Segurança. Trad. Erick Vasconcelos. São Paulo: Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2014. 50 p.

MAZZILLI, Marcello. Estado? Não, obrigado! São Paulo: Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2010. 150 p.

HOPPE, Hans-Herman. Manual para entender direito o Libertarianismo. Revisado, editado por Rick Theu. Disponível em https://rothbardbrasil.com/manual-para-entender-direito-o-libertarianismo/.

Canal L de Liberdade - Playlist de Segurança e Justiça Privadas.

"O Princípio da Não-Agressão está em nossos genes": https://www.youtube.com/watch?v=58ABc95mHIQ